O transplante é um procedimento cirúrgico em que há reposição de um órgão (coração, pâncreas, pulmão, fígado, rim) ou de tecidos (medula óssea, ossos, córneas) de um indivíduo doente por outro órgão ou tecido saudável de um doador, morto ou vivo. A doação após a morte acontece quando a pessoa é diagnosticada com morte encefálica e sua família autoriza a retirada de seus órgãos para transplantes. Já, a doação em vida é um ato voluntário do próprio doador e, de acordo com a legislação brasileira, só pode ser feita por parentes de até quarto grau do receptor ou pelo cônjuge. "Se não for familiar, é exigida a autorização judicial, para evitar qualquer possibilidade de comércio", explica o médico Valter Duro Garcia, presidente da Associação Brasileira de Transplante de Órgãos (ABTO). Além disso, é preciso que o doador seja maior de idade e saudável. Um médico deverá avaliar a história clínica da pessoa e suas doenças prévias. A compatibilidade sanguínea é primordial em todos os casos. Há também testes especiais para selecionar o doador que apresenta maior chance de sucesso.
Segundo Valter, os órgãos que podem ser doados em vida são: rim (são os casos mais comuns), parte do fígado (menos frequente, mas possível pela sua capacidade de regeneração), parte do pulmão (casos raros, geralmente para crianças e com a necessidade de dois doadores para um receptor) e até mesmo parte do pâncreas e do intestino (ambos em situações excepcionais). "No Brasil, são realizados, por ano, com doadores vivos, cerca de 1,2 mil a 2 mil transplantes de rim, 120 a 160 de fígado e um a três de pulmão", afirma o médico. Com relação aos tecidos, o único que pode ser transplantado em vida, e somente em vida, é o das células hematopoiéticas, ou seja, da medula óssea. Nesse caso, a pessoa não precisa ter laços de parentesco com o doente. "É só ir ao banco de medula, coletar uma amostra de sangue e, se alguém que precisar do transplante for imunologicamente compatível, será solicitada a doação da medula óssea", explica o clínico-geral Leonardo Borges, coordenador da Organização de Procura de Órgãos do Hospital das Clínicas da Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo (USP). Por não apresentar riscos ao doador, essa é a única forma de transplante que permite que crianças e gestantes também sejam doadoras. Para os demais órgãos, no entanto, os riscos existem e são os mesmos inerentes a qualquer cirurgia. "Apesar de toda investigação prévia demonstrando que o doador é saudável, a remoção de órgãos apresenta o risco da anestesia e de embolia pulmonar, além daqueles que envolvem o procedimento, como sangramento e infecção", esclarece Valter Garcia. Porém, ele afirma que, realizando-se as avaliações médicas adequadas no paciente e tomando-se as devidas medidas de prevenção, com uma equipe experiente, os riscos são mínimos. "Se eles fossem altos, a gente não faria", complementa Leonardo.
São diversas as doenças que podem levar à necessidade desses transplantes. No caso do rim, a hipertensão e o diabetes são as principais causas da perda de função do órgão. Já o fígado precisa ser substituído quando os pacientes apresentam falência hepática provocada por problemas agudos, como hepatite fulminante, ou crônicos, como cirrose, ou mesmo por tumores na região. O transplante pulmonar, por sua vez, é indicado para doenças terminais, geradas por fibroses, enfisemas e doenças obstrutivas crônicas. No caso da medula óssea, a cirurgia é recomendada para tratar pacientes com anemia aplástica, leucemias, linfomas e mieloma múltiplo. "Após a operação, a maioria dos receptores apresenta excelente reabilitação, com retorno às atividades habituais", afirma o presidente da ABTO. "Mas a recuperação depende do tipo de transplante e da gravidade que o paciente estava na época. Devido aos riscos de rejeição e de outras complicações, ele fica de uma a quatro semanas internado e deve tomar medicação imunossupressora o resto da vida". O doador, no entanto, apresenta recuperação muito mais rápida. "No caso do transplante renal, por exemplo, ele fica internado de três a cinco dias e retoma suas atividades normais, como dirigir e trabalhar, em torno de três semanas", conta o médico. Após esse período, ele volta a ter uma vida normal, sem nenhuma restrição física ou alimentar - mas deve fazer uma avaliação clínico-laboratorial anual.